segunda-feira, 1 de março de 2010

Pearls to PIGS


Por Paulo Linhares*
O ciclo virtuoso criado com a implantação da moeda única - o Euro - parece que se esgotou para alguns países da área da Comunidade Econômica Europeia, mormente aqueles conhecidos pela curiosa sigla PIGS, que é o acrônimo, em inglês, para Portugal, Itália, Grécia e Espanha (atualmente o "i" da sigla não se refere apenas à Itália, mas, também, à Irlanda).

Os analistas econômicos tanto da academia quanto da imprensa foram cruéis quando engendraram essa sigla pela qual passara a conhecer um grupo de países membros da União Européia, pois ela quer dizer "porcos", em inglês.
Nas minhas primeiras viagens à Portugal e à Espanha, a despeito dos tantos monumentos históricos a conhecer, sobretudo aqueles bem evocativos da história do "descobrimento"/colonização do Brasil, admirava-me o atraso desses países se comparados com o nosso, mais especificamente de Portugal, a começar pela tradição de longos governos autoritários, eles com Salazar e Franco, ditadores à moda antiga, exercente de poder unipessoal. Aqui, ao menos a última ditadura que o Brasil teve (de 1964 a 1985), havia uma preocupação do estamento despótico que governava de, ao menos, manter um simulacro de democracia, com o funcionamento dos três poderes do Estado, embora somente o Executivo tivesse peso, além de algumas eleições, a despeito de um longo período o povo ser impedido de votar para presidente, governador de Estado, 1/3 de senadores e prefeitos das capitais dos Estados.

Claro, ditadura é ditadura e não interessa, aqui, nem a mim nem ao benévolo leitor, ficar a discutir se a dita foi branda, mais dura ou meio mole. Tudo finda mesmo em prejuízo para o desenvolvimento das pessoas e das nações. Ditadura é sempre treva e trave. Uma frase do velho ditador António de Oliveira Salazar sobre seu país: "Dêmos à nação optimismo, alegria, coragem, fé nos seus destinos; retemperemos a sua alma forte ao calor dos grandes ideais e tomemos como nosso lema esta certeza inabalável: Portugal pode ser, se nós quisermos, uma grande e próspera nação" (ortografia lusa de então).

Bem, mas Portugal, depois de democratizado, em 1975, com a Revolução dos Cravos (...“Foi bonita a festa pá, fiquei contente. Ainda guardo renitente um velho cravo para mim... ”), iniciava um longo processo de reconstrução institucional e econômico, num afã de superar um atraso de mais de quatro décadas (de 1932 a 1975) de autoritarismo e estagnação política, social e econômica. O atraso de Portugal chegou ao fim quando criada a União Europeia após a assinatura do Tratado de Maastricht, em 7 de Fevereiro de 1992.

Com a UE vieram os maciços inverstimentos e a grande esfinge sob a roupagem reluzente da moeda única da Europa, o Euro. Desde os tempos das colonias (sobretudo da rica colonia sul-americana, o Brasil), que os lusos não viam tanta brasa para suas sardinhas... Uma coisa deu errado: Portugal gastou mais do que a sua (frágil) economia podia suportar (o mesmo ocorreu com Irlanda, Itália, Grécia e Espanha, com variações próprias a cada país) e está a engolfar-se numa profunda e imprevisível crise econômica.

Os portugueses, até há bem pouco tempo a esnobar dos seus manos brasileiros, olham contritos para o vistoso lema da União Europeia: In varietate concordia ("Unidos na diversidade"). E não exergam uma saída para o atoleiro em que se meteram. Os órgãos econômicos (Comissão Europeia e Banco Central Europeu) de UE tangem os PIGS com uma pontiaguda vara de ferrão, a exigir sacrifícios e cortes na própria carne, para debelar a crise cuja característica maior é justamente a da diversidade, porém com um ponto comum: é uma crise monetária de tipo novo, a primeira a ocorrer na Zona do Euro (alguns países da UE não adotaram a moeda comum, a exemplo do Reino Unido), cuja solução ainda não é visível.

Sem mais investimentos salvadores da UE, pois não mais querem botar dinheiro bom em cima de ruim, que é como jogar pérolas aos porcos. Depois de esnobarem seu irmãos brasileiros - que sempre os acudiu - os portugueses começam a cair na real e até já desconfiam que aquele "Portugal pode ser, se nós quisermos, uma grande e próspera nação", do velho tirano Salazar, é ufanismo bobo e nada mais. Alguns até já espicham os olhos para aquela ácida frase do padre Antônio Vieira, tomada como imperdoável perfídia na terras portuguesas: "Chamam de fausto ao fausto porque é infausto; ao mundo de mundo porque é imundo. E a Portugal de Lusitânia, porque nunca luziu nem há de luzir". Pano rápido. Pausa para um cálice de porto, pois...

* Paulo Afonso Linhares é Defensor Público-Geral do Estado, Professor e Escritor.

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