Por Paulo Linhares*
Um sábio magistrado sertanejo, Dr. Luiz Diógenes, costumava advertir as partes, nas audiências judiciais, que esperassem qualquer coisa dos seus julgamentos, menos um empate; em suma, uma venceria e sobre a outra, sucumbente, cairia o pesado tacão da lei. Isso dito por ele, de modo bem pouco amigável, quase sempre era um santo remédio para que os maridos e pais recalcitrantes se encaminhassem para uma composição, um acordo, nas tantas audiências de ações de alimentos que realizava em uma só manhã. Em suma, na Justiça caberiam a contenda e até o acordo, jamais o empate, principalmente nos juízos monocráticos.
Claro que nos juízos colegiados, nos tribunais, os empates são corriqueiros e solucionados pela regra do voto de desempate - ou ''voto de Minerva'', como se dizia antigamente -, de cunho regimental e a cargo dos presidentes dos tribunais. Assim, jamais haveria impasses intransponíveis - os chamados ''buracos negros'' - porquanto os empates seriam resolvidos. Recentemente, contudo, ocorreu um desses graves impasses e logo no Supremo Tribunal Federal (STF), ao ensejo do julgamento da questão constitucional que envolve a Lei da Ficha Limpa.
O Tribunal Superior Eleitoral decidiu pela cassação da candidatura do ex-senador Joaquim Roriz a governador do Distrito Federal, sob o argumento da imediata aplicação da Lei da Ficha Limpa. Roriz não se fez de rogado e levou o caso ao STF. Nessa instância extraordinária, ocorreu o empate (cinco ministros votaram contra e cinco a favor) e o impasse, com a recusa do presidente César Peluzzo de proferir o voto de desempate, deixando a questão para ser resolvida somente com o preenchimento da vaga aberta com a aposentadoria do ministro Eros Grau. O novo ministro do STF a ser nomeado ainda pelo presidente Lula, vai chegar já sob fogo cruzado. O presidente César Peluzzo, que disse ser a Lei da Ficha Limpa uma “arremedo de lei”, se recusou dar o “voto de Minerva” ao argumento de que não tinha vocação de autocrata e que seu voto deveria ser, naquela questão, o mesmo peso dos seus colegas. E formou-se um verdadeiro “buraco negro” jurídico-político que poderá tragar toda a credibilidade adquirida nos últimos anos, sobretudo na gestão de Gilmar Mendes, pelo STF.
Nesse episódio, foi triste o papelão protagonizado pelos ministros da mais alta Corte, que mais pareciam garotos em discussões de grêmios escolares, tudo na base do senso comum. Mesmo os bons juristas da Corte, a exemplo de Gilmar Mendes, Celso Melo, Carmen Lúcia e o próprio Peluzzo, pareciam confusos. Os bate-bocas foram inevitáveis e absolutamente desqualificados. Fato é que o mais importante Tribunal do país esta embananado com essa vexata quaestio, a ponto que a preocupação maior de seus membros é com a opinião pública, de como vão sair na foto.
Aliás, a transmissão da sessão de julgamento, iniciada em dia 23 de setembro de 2010, entrou noite adentro. Os bocejos e cochilos foram inevitáveis e não fossem os apelos da (bela e culta) ministra Ellen Gracie, que pediu a suspensão da sessão, esta teria chegado à manhã. A exposição direta do julgamento do STF, celebrada como um dos grandes avanços no rumo da democracia eletrônica e da democracia participativa, findou enfatizando muito a sessão pastelão do dia 23, talvez como um dos momentos mais difíceis daquela instituição mais do que centenária. Ao vivo e nas cores dramáticas do severo impasse instalado. Agora é torcer que chegue logo o novo ministro e que traga um bom juízo salomônico. O STF precisa muito disto. Aguardemos.
* Paulo Afonso Linhares é o Defensor Público-Geral do Estado, Professor e escritor.
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